Fatal


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Não queira saber o que estou sentindo. Não me peça para revelar o que em mim está guardado por tanto tempo. Sou ave presa à espreita de uma fresta. Um dia, quem sabe, saberás o que em mim ficou e se sobrou alguma coisa de nós dois. Quando se olha para trás, perde-se o que está vindo. Sigamos! Mesmo que numa paralela. Revisito somente o que em mim deixou claridade. Não é o caso!

Nem sempre estamos preparados para darmos de cara com a Monga. Não é mesmo?! O espelho jamais revelará a alma. Fora tão superficial tudo aquilo, mas que só agora eu percebo a perda de tempo - fora tudo ilusão. Pura física. Nada além disso.

Às vezes para atravessar o desconhecido temos que nos equilibrar num fio não muito resistente – faz parte do perigo (ou da vida). Lá estava a aranha em sua teia, do outro lado do abismo, à espera de seu visitante. Depois de seu propósito, a morte é certa. Faz parte de sua natureza. Dela e de muitas outras.

Ela sabia que não era amor, mas fingiu ser. Ela sabia que não duraria, mas fingiu eternidade. Ela não tinha oito pernas, mas o enlaçava como se tivesse. Ela sabia o que queria, mas fingiu ingenuidade. E depois de seu propósito, diferente do aracnídeo, amputou os seus membros. Faz parte de sua natureza, abandonar quem lhe quer bem. No caso da aranha, o macho sempre sabe que não sobreviverá.

Como sei que nem sempre vou estar preparado para dar de cara com a mulher-gorila, evito o jogo de espelhos. Não me arrisco no desconhecido e prefiro o chão batido. Sempre há a esperança do nascer de uma flor. É da minha natureza acreditar.

Então, não me pergunte o que estou sentindo. Não me peça para revelar o que em mim está guardado. As virtudes são minhas, os defeitos são meus e os pecados eu pago depois. As gavetas já foram arrumadas, as paredes mudaram de cor e o jardim... este, está mais colorido – as flores são outras.

E agora, exatamente agora, termino o texto ouvindo fósforo queimado deitado na rede da minha varanda.


Sintonia




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Acordei com uma vontade danada de estar com você. De quando em vez tenho a sensação de que tudo está fora do lugar. Hoje, meus olhos demoraram a enxergar. Insistiram em querer sonhar. De olhos fechados enxergo melhor o invisível. Palpável somente dentro - a alma sabe afagar o que os olhos não alcançam. Sonho. E sonhando vou levando, transformando, imaginando outros sonhos e colorindo o que antes não tinha cor. Colorir a vida é necessidade básica, nesse momento tão incerto. Principalmente em tardes tristes como a de agora.

Ela estava sentada ao meu lado. Uma mistura de verdade e ilusão. Ainda continuo tímido na multidão. Esparramado somente em meu quarto. É nele que canto e danço bolero; que sorrio e choro; que falo o improvável e assopro palavras em corpos nus. Meu quarto, meu templo.

O dia ficara mais quente e mais claro quando ela chegou. O sábado se transformara em poesia de Vinicius. A minha boca, inexplicavelmente, tornou-se menos tímida que os meus olhos, e o silêncio fora quebrado e nos descobrimos em assuntos variados sem pé e sem cabeça. A diversidade fez o lugar e sorrimos juntos e bebemos juntos e fumamos juntos. Ela trouxe, de volta, um tempo que eu pensara ter perdido para sempre. Ledo engano.

Tem gente que consegue tatuar a nossa alma. Ela tatuou-me de primeira. Gosto disso! Tesão instantânea. Vontade de estar e querer ficar. Quereres sem fim. Plantar e esperar o fruto amadurecer.

Tem gente que consegue afastar pra bem longe o que é triste. As nuvens negras se foram levando com elas a desesperança. Deixando comigo a leveza do ser.  

Tem gente que consegue, somente com um sorriso, transformar um dia qualquer em domingo. Espreguicei-me em sonhos e possibilidades. A rede embalou-me até o sono chegar.

Tem gente que consegue voar em poesias. Agarrei-me em suas asas e viajei para bem longe dali em rimas e devaneios.

Tem gente que consegue nos deixar do avesso. Por alguns instantes tornei-me o mais canalha dos homens.

Tem gente que sabe chegar. A tarde se foi e ela também. Mas o céu afagou-me depois do crepúsculo com estrelas, lua prateada e feitiço.

Tem gente que consegue transformar um momento casual num futuro provável. Acordei com uma vontade danada de tê-la só para mim.


Sorte! Ela me deu o número do seu celular.