Frente fria.





- A névoa chegou de repente contrariando aquela manhã de dezembro. Era quase verão. Depois da bruma, o céu molhou o chão com uma chuva fina e gelada. No lugar dos shorts, das sandálias e das camisetas estampadas, surgiram tocas, botas, casacos pesados, guarda – chuvas pretos e sombrinhas coloridas. A névoa chegou encolhendo o dia, expulsando o sol, aguando os caminhos e, sobretudo, paralisando o coração.

O corpo enrijeceu-se diante da nebulosidade inesperada. Defesa de quem, até há pouco tempo, acreditava no brilho e no calor humano. Não é fácil o desapontamento. Parecia ser tão simples, bastavam um abraço, um beijo, um afago, que tudo se tornaria leve e transparente. Mas a vida é mais que isso: Há um mundo lá fora, há gentes; há intemperes; há labirintos complexos e muitos deles infinitos.

Depois do silêncio, a avalanche é certa. E depois dela, o caos é inevitável. E depois de tudo isso, as opções são poucas: ou mantém-se o emaranhado construído, ou desata-se cada nó encontrado.

O monossilabismo, de quando em vez, invadia o silêncio que já há muito tempo habitava aquele espaço. Seriam os nós desatando? Ou seria a construção aflita da inevitável desordem?

Isolados, transformaram-se em ilhas - cercadas de angustia e desconfiança. Não havia caminho, não havia ponte. Não havia horizonte. O desalento corroía aos poucos, deixando oco o que antes era sonho.

De repente, numa manhã de sábado, o sol desaparecera, dando lugar a escuridão e a vertigem. O silêncio, fora invadido por músicas quase tristes. O vento chegara miúdo e frio. Trazia consigo cheiro de barro enfeitado de infância.

A música era suave e antiga; os olhares, não. Os corpos juntinhos transcendiam – cúmplices de desejos guardados. O chão de madeira acolhia os pés descalços em passos delicados. A penumbra completava a paisagem que despertava, em ambos, sentimentos esquecidos.

De repente a manhã se fora, o sol reaparecera e a escuridão se dissipara dando lugar a lucidez. A realidade era maior que os sonhos. A despedida fora silenciosa. Sem gritos, sem porrada... simplesmente uma despedida melancólica.

- Que pena, parecia que tudo se inverteria...

- Que nada! Hoje, são amigos.