Companheiros

Não faço nada quando chego em casa enquanto não encontro os meus amigos. Eu sou assim. Dano a procurá-los. Não tiro a mochila das costas nem os sapatos, vou direto ao encontro deles. Olho para um, flerto com outro - volúvel? Eu sei. Fico sempre indeciso, mas acabo escolhendo o mais próximo da minha necessidade momentânea - certo egoísmo? Com certeza. Geralmente, o escolhido é aquele que vai me dizer o que eu quero ouvir – unilateral? Também. Depois da escolha, aí sim, coloco a bolsa no lugar, tiro os sapatos, afrouxo o cinto e ali, naquele sofá vermelho, converso com eles ou simplesmente os ouço. Eles são ótimos.
Hoje, quero agradecer a esses companheiros invisíveis que estão sempre à minha espera. Obrigado: Chico, Caetano, Paulinho, Gil , Oswaldo, Edu, Tom, João,Vinicius, Ney, Zeca, Djavan, Jorge, Luis, Martinho, Nora, Maysa, Bethânia, Nana, Gal, Simone, Adriana, Zélia, Rita, Ivone, Elis, Maria, Leci, Ana e tantos outros, obrigado... obrigado por existirem.

Adoro os meus discos!


Paulo Francisco

Elas

Tenho que ir ver a minha comadre da cidade. Sim, tenho duas, uma é urbana e a outra é rural.
Amo-as de forma diferente. A da cidade é um amor a luz neon – brilhamos quando estamos juntos. A da área rural é um amor de cheiro – cheiramos a ervas medicinais.
Não é mesmo Márcia e Mônica?


Paulo Francisco

Elas

Conceição  era a mais famosa das quatro irmãs. Famosa por ser a única com faculdade, por ter namorado muito e se casado cinco vezes. As outras três vivem a falar que Conceição fez o que elas não conseguiram, exceto por uma coisa, todas têm netos, Conceição, coitada, não. Só esqueceram-se de dizer que é por opção e não por rejeição. Conceição anda por aí, desfilando em seu carro importado com sua nova namorada e feliz.  

Vilma gostava de seus cabelos negros e compridos, passava horas diante do espelho escovando-os.  Certo dia, num lampejo de loucura, cortou-os sem pestanejar.  Hoje, livre, leve e solta, anda por aí, esbanjando sensualidade com seus cabelos curtos e ruivos. Agora o espelho é ela.

Vanessa adorava curtir a noite.  Não, ela não era baladeira. Era sonhadora. Conversava com as estrelas. 

Tiana, abreviatura carinhosa de Sebastiana, ficara acamada por dias. Sozinha no mundo por opção, ela precisou, por necessidade, pedir a sua irmã um prato de sopa, pois estava fraca. Quando recebeu o recado que não teria o que comer, Tiana disse com toda força que ainda lhe restava: ¨ Eu morro de fome, por não ter como fazer, ela, morrerá por ter e não poder comer. ¨ Tiana morreu semanas depois.

Sua irmã morreu mais tarde, bem mais tarde. Não é preciso dizer como.


Paulo Francisco

Elas

Quando pegou um novelo de lã para fazer um cachecol, os  filhos estranharam aquela atitude, afinal, tinha em seus conceitos uma mãe moderna, possuidora de facebook, blogue e que curtia relações virtuais.  Vânia respirou e pensou. ¨ Deixe-me fazer este presente pra ele. ¨ Ele? Bem.., ele era o novo namorado encontrado por fios invisíveis que ela sonha em tê-lo por fios tecidos.

Léia, secretária poliglota de uma empresa nacional, era a ponte entre os importadores e seu patrão. Este, de pouco estudo, conseguira vencer na vida, com muito trabalho e arrojo – nunca tivera medo de arriscar, contrário de Léia, que por medo de perdê-lo, permaneceu secretaria e morrerá secretária, poliglota e suspirosa.

Laura, Esse será o seu nome!. Exclamou a avó quando a menina nasceu. Todos acharam que era um nome fora de moda, duro e sem brilho. Todos, exceto a avó, estavam errados.

Paulo Francisco

Elas

Abigail sempre soube que seria Arquiteta. Passou no primeiro vestibular que fez. Nunca perdera um projeto, mesmo que a margem de lucro fosse diminuída. Seu sucesso dependia, também, dos outros sócios minoritários. Trabalha com mão de ferro. Todos a tratam com certa cautela face o seu temperamento bipolar.
Abigail nunca se casou, já até pensou, mas, ela não sabe como arquitetar um bom plano para esse lar. Tem medo de não conseguir.
Nara era uma menina sapeca. Tornou-se uma adolescente linda e problemática. Não gostava de estudar, mas adorava namorar. Sorria, com os elogios recebidos.  Ela não terminou o ensino médio – não conseguia se concentrar. Hoje, com dezenove anos, trabalha numa confeitaria,  e, de quando em vez, faz uns voos até a Capital para o seu namorado. Nara se transformou num verdadeiro avião.  Todos dizem.
Zara sempre estava pronta para ouvir os amigos. Eles sempre recorriam a ela para as suas lamentações – ela sempre tinha uma palavra de confiança. Zara, todas as noites, ajoelhada em seu quarto, conversa baixinho com quem pode ouvi-la de verdade. Zara carrega consigo uma luz própria. Todos dizem que ela é iluminada.


Paulo Francisco