Engole o choro! Como engolir algo que quer ser expurgado?
Aprendi ainda criança a chorar miúdo. Era um choro triturado, tímido, quase
silencioso. Demorei pra entender que o meu choro era delação. E quem quer ser
denunciado? Também demoraram pra entender que de quando em quando as comportas
têm que ser abertas. Afinal, somos setenta por cento água. E mais que isso,
morremos afogados ou nos transformamos numa melancia. E quem quer ser devorado
pela gulosa Magali?! Eu não queria, então, chorava a conta-gotas.
No balcão da padaria preferida, entre um gole de café e uma
olhadela aos outros cafeínados, um choro agudo e intermitente vinha em nossa
direção aumentando os seus decibéis a cada segundo. E a cada segundo o meus lábios manchados se
esticavam num sorriso debochado. Lembrei-me do João Gabriel quando botava a
boca no trombone e desafinava um choro pirracento. Fazer o quê? Ele desafiava e exorcizava os
meus fantasmas. Só tenho que agradecê-lo.
Mas quando o pequeno tenor passa por nós no colo de sua maestrina
descabelada e irritada, a moça que estava ao meu lado exclama:
- Ahhhhhhhhhh se fosse meu filho!
Virei para o seu lado e a interrompi dizendo que chorar
naquela idade faz bem para os pulmões. A mulher me olhou e, imediatamente, se
inclinou para trás como se tivesse levado um tapa. Não foi minha intenção.
Mas voltando aos meus choros. Eles deixaram de ser miúdos para serem
escancarados, gritados, quase depravados. Chorei muito nessa vida. Talvez eu tenha
mais chorado que sorrido. Porque alguns sorrisos contidos eram simplesmente um
disfarce ao soluço engolido. Quem já não chorou ouvindo uma canção? Quem já não
se desesperou em uma despedida? Ou por uma pura desilusão?
- Você andou chorando?
- Claro que não! Meus olhos ficam vermelhos em banhos
demorados.
O chuveiro sempre fora o meu melhor amigo e cúmplice em
alguns desesperos. Hoje, eu não preciso mais dele. Tenho o meu silêncio e o
vento como companheiros nas horas tristes.
E dos meus choros
bandidos faço poesias.
E dos meus choros velados
faço canções.
Hoje eu não engulo o choro. O amparo com as mãos. E se não o
amparo, deixo que reguem o meu caminho. Quem sabe não surja flores na aridez vivida.
Mas pior que engolir o choro era ouvir daqueles que amamos
que homem não chora.
Ah, Chora sim!
Paulo Francisco