Elas

Katarina chorou na festa de seu primeiro aniversário – teve medo do palhaço. Ela chorou em sua festa de doze anos – teve medo de ser mocinha.  Também chorou quando debutou – teve medo de não ter um príncipe. Chorou, copiosamente, em seu casamento - teve medo de tanta felicidade. Katarina ainda chora – chora pra regar a alma. Ela tem medo de secar.

Margareth, sempre fora atirada pra vida. Nunca teve medo de nada. Enfrentava tudo a unha. Mas quando Margareth deu a luz, ela chorou e teve medo do mundo.

Mônica, mulher negra, alta e esportiva. Gosta de vôlei e sexo. Não necessariamente nessa ordem. Casou-se algumas vezes e perdera a conta dos namorados que já teve. Mônica, uma negra alta que chega às alturas por uma bola e por um beijo.

Verônica, mulher miúda e intrépida. Cresceu quase dois metros pra dizer cara-a-cara ao homem que mexeu com ela na rua. Verônica cresce diante do atrevimento alheio.


Paulo Francisco

Mudança de tempo




Cinco dias de chuva. Não aguentando mais tanta água caindo do céu, tira a roupa e nu em plena sala, dança chamando o sol. Não é que dá certo. No outro dia, um sol lindo surge no céu. Levanta-se, veste um calção de banho e fica o dia todo na praia, mais propriamente dentro d água para refrescar-se do calor. Vai entender.


Paulo Francisco

De volta ao passado

Caminhando pelas calçadas de Teresópolis, onde vivo, acabei entrando numa importadora antiga   –  a importadora Ingá.  Atraído por algo mágico,  deparei-me com uma fileira de perfumes e li: 4711. Sorri, pois lembrei-me de que um dia roubei na cara dura este perfume de minha namorada (hoje minha amiga). Na época, não tinha graça comprá-lo. Foi gostoso usar gotinhas diárias de minha infância.
Estou pensando se compro ou peço que ela compre. Só para sentir o gostinho de roubá-la novamente.



Paulo Francisco

Questão

Não consigo me inventar. E ela queria que eu fosse de outro jeito. Até tentei, juro que tentei, mas como se transforma um bicho solto num bicho manso?


Paulo Francisco

Lembranças

Hoje, não sei o porquê, lembrei-me de alguns colegas de minha infância. Eles me ensinaram como eu deveria ver o mundo. Sim, os meus amigos, ensinaram-me a traduzir o mundo. Por exemplo, o Adilson e sua irmã Preta, dois irmãos de uma ninhada de seis (eu acho). Eles eram os únicos daquela trupe que tinham algo a mais para nos oferecer. Eram os mais inteligentes, os mais criativos, os mais felizes. Quem disse que pelo fato de não poderem andar deixaram de correr o mundo?.


Paulo Francisco