É engano! Desligo o telefone e fico pensando na frase que dei para aquela voz feminina e macia.
E quantos enganos cometemos nesta vida de Deus. Não foi um engano ter dito pra ela que era engano? De não ter dito que eu não era o Pedro, mas que poderia ajudá-la mesmo assim?
Já me enganei tantas vezes, que perdi a conta.
Já desci no ponto errado e tive que andar duas quadras, simplesmente, por te me enganado.
Já mandei cartão de aniversário para a pessoa errada e tive que rezar um rosário para explicar o tremendo engano.
Já achei que tinha encontrado um amigo, e quando bato em suas costas, vejo que a cara não é a mesma.
Já dei meu telefone errado, por um algarismo trocado e, deixei de receber um sim, para um encontro
Já cheguei atrasado ao dentista vinte e quatro horas depois.
Já me enganei, achando que iria fazer sol e não levei comigo o guarda-chuva.
Foram tantos enganos: uma amizade errada, uma catarse desnecessária, uma porrada na mesa, um adeus precipitado...
[silêncio]
Era ela de novo, perguntando pelo Pedro.
Marcamos nos falar mais tarde, depois que ela disser pra ele que foi um engano.
Paulo Francisco
Durmo contemplando o céu marinho, acordo com ele azulzinho. Não gosto de discursos, gosto mesmo é de poesia. Odeio conversas fiadas, mas adoro uma boa história contada.
A chave segredo
Cadê a chave!? Todos os dias eu uso a mesma frase. Não aprendo. Eu nunca sei onde o meu molho de chaves está. Incrível como ele desaparece tão rápido.
Por causa desta falta de organização, deste meu lado bagunceiro e displicente, eu acabo ficando em apuros.
No trabalho quando chego com a cara de atleta que acabou de cruzar a linha de chegada, todos já sabem e dizem: – ¨Não encontrava a chave, por isso do atraso!¨
Coitados dos courrier, motoboy, carteiro e amigos. Atendo da sacada já gritando:
- Oi! tô descendo. (O cara acredita).
Dano a procurar a chave. Mentalmente, eu retorno ao meu portão na noite anterior e, tento fazer o caminho, passo a passo, pra vê onde eu deixei o bendito chaveiro. Nada. Volto pra sacada e digo:
- Peraí, to procurando a chave... um instante!. (E ele espera).
Volto de novo à sacada, angustiado e preocupado com o camarada a minha espera, grito:
- Aí, bacana, não tô encontrando a porra da chave, espera mais uns segundinhos que eu já vou descer.
Visto uma bermuda, porque, geralmente, quando toca a bendita campanhinha, eu estou na boa, tranquilão.
E quase sempre tenho que pegar a encomenda pelo muro ou, peço para o entregador deixar do lado de fora do portão. Assino a entrega e volto à procura da infeliz.
Subo, sempre, dizendo:
- Onde eu botei a bosta da chave!
Eu estou sempre procurando:
- Cadê a chave?
- Cadê o livro?
-Cadê a minha bolsa?
- Onde eu deixei aquele documento?
Agora, estou tentando policiar-me, assim que chego, tento deixá-la num lugar específico, mas é difícil, muito difícil, uma atitude metódica, pra quem sempre foi desorganizado.
Nesta tentativa de me livrar de alguns caos em minha vida, acabei encontrando outra chave. Uma chave pequena, que estava perdida há muito tempo, mas que abre um compartimento imenso.
Corri até uma das gavetas e peguei um cordão antigo e a prendi nele.
Agora ele anda sempre em meu pescoço e ela bem próximo do meu peito. Toda vez que alguém tenta trancar o meu coração, eu vou lá e abro de novo.
Por causa desta falta de organização, deste meu lado bagunceiro e displicente, eu acabo ficando em apuros.
No trabalho quando chego com a cara de atleta que acabou de cruzar a linha de chegada, todos já sabem e dizem: – ¨Não encontrava a chave, por isso do atraso!¨
Coitados dos courrier, motoboy, carteiro e amigos. Atendo da sacada já gritando:
- Oi! tô descendo. (O cara acredita).
Dano a procurar a chave. Mentalmente, eu retorno ao meu portão na noite anterior e, tento fazer o caminho, passo a passo, pra vê onde eu deixei o bendito chaveiro. Nada. Volto pra sacada e digo:
- Peraí, to procurando a chave... um instante!. (E ele espera).
Volto de novo à sacada, angustiado e preocupado com o camarada a minha espera, grito:
- Aí, bacana, não tô encontrando a porra da chave, espera mais uns segundinhos que eu já vou descer.
Visto uma bermuda, porque, geralmente, quando toca a bendita campanhinha, eu estou na boa, tranquilão.
E quase sempre tenho que pegar a encomenda pelo muro ou, peço para o entregador deixar do lado de fora do portão. Assino a entrega e volto à procura da infeliz.
Subo, sempre, dizendo:
- Onde eu botei a bosta da chave!
Eu estou sempre procurando:
- Cadê a chave?
- Cadê o livro?
-Cadê a minha bolsa?
- Onde eu deixei aquele documento?
Agora, estou tentando policiar-me, assim que chego, tento deixá-la num lugar específico, mas é difícil, muito difícil, uma atitude metódica, pra quem sempre foi desorganizado.
Nesta tentativa de me livrar de alguns caos em minha vida, acabei encontrando outra chave. Uma chave pequena, que estava perdida há muito tempo, mas que abre um compartimento imenso.
Corri até uma das gavetas e peguei um cordão antigo e a prendi nele.
Agora ele anda sempre em meu pescoço e ela bem próximo do meu peito. Toda vez que alguém tenta trancar o meu coração, eu vou lá e abro de novo.
Paulo Francisco
A maçã
A menininha tirou do bolso de meu casaco o meu segredo: a maçã escondida.
Guardo comigo as lembranças de minha infância em papel de seda roxo: bruxas e fadas, maçãs e poções mágicas, heróis e vilões, apaches e caubóis, padres e vampiros, fantasmas e casarões antigos – ficávamos hipnotizados, ouvindo a mulher gorda e caolha a nos contar histórias antigas e assombrosas. Descobrimos a eletrostática, antes mesmo, de irmos à escola – ficávamos de cabelos em pé ouvindo a velha senhora com a sua voz rouca. Medos escondidos de olhos fechados em quartos escuros.
O menininho sentia dor, era intenso o seu lamento – era quase um mantra do desespero. Os seus olhos lacrimejantes e sua face pálida nos pediam socorro. E mesmo estando o menino aconchegado ao colo de sua avó, sua imagem era de sofrimento e abandono. Eu não aguentei a dor exposta, sou covarde às dores alheias, retirei-me em silêncio por sentir-me inválido diante do invisível. Voltei ao trabalho com pesar. Voltei para a minha realidade menos sofrida.
As minhas dores eram intensas. Chorava miúdo, andava pequeno e curvado. Meu choro era seco – um verdadeiro lamento. Lamentava-me por não ter o colo de quem eu amava para aquecer-me e curar-me naquele momento de dores intensas e invisíveis. Caminhava a passos curtos à procura da cura.
Em meu quarto, somente a penumbra me entendia e acariciava-me com mãos que afagam. Em tempo de dor, o sol permanecia lá fora, bem longe de meus olhos chorosos. A solidão, naquele momento, era a maior dor do mundo. Menino perdido num tempo ditado por uma linha dura.
Quando ela chegou, acompanhada de sua mãe, com ele nos braços, e entregou-me como se fosse um fardo pesado demais pra elas, eu chorei. Chorei pela dor existente; Chorei pela negligência velada; chorei pela distância provocada. Acalentei-o até a sua dor passar. Emprestei meu colo para aquecê-lo, cantei música de ninar até o sono chegar. O amor cura mais que tudo – ele pode curar o mundo; ele pode curar-me também.
Quando elas voltaram para apanhá-lo, ele já sorria - estava mais forte e muito mais bonito. Chorei miudinho, choro abafado, pra que ninguém escutasse a saudade guardada de uma vida inteira. Fiquei ali, vendo-os afastarem-se mais uma vez de mim. Horizonte perdido aos olhos de quem ama. O sol deu lugar para lua e as estrelas solidárias cobriram e aqueceram o meu corpo pálido. Deitei-me no colo materno e fui acalentado por mãos que curam.
A avó se mantinha calma diante da dor do netinho. Acalentava-o, com voz de passarinho - admirável amor avoengo.
A menininha, toda maquiada - se achava mocinha - comia pelas mãos pacientes de sua avó. Eram colheradas de amor pra alimentá-la por toda a vida. Avito-amor.
As correntes se arrastavam naquele terreno que um dia foi senzala – escutávamos os elos rangerem na voz da velha gorda contadora de histórias. Nossas caras assustadas e nossos corpos encolhidos, naquelas noites frias de lua azulada, eram a recompensa que a caolha esperava. Nossos medos, sua alegria.
Tudo era mágico, até o banho de tanque pra tirar o pretume de um dia de futebol e pipa. Mãos calejadas que esfregavam sem dó o corpo de menino-sujinho. Mãos de avó, sabão e muito choro hidrofóbico, compunham aqueles finais de tardes de estios. Retrato da vida em preto e branco – lembranças jamais esquecidas.
E, naquela tarde, a menininha deu-me tchau e sorriu. E, naquela mesma tarde, o menininho não chorou mais – acabaram as suas dores tão sofridas e reais.
E, naquela noite de lua alaranjada, retrocedi na minha linha do tempo, sai da condição de pai e virei filho e, neste caminho, encontrei-me neto e franzino; descobri-me amado, levado, triste e feliz. Sentimentos turbinados por ventanias repentinas.
E, sujo ou limpinho, eu tinha todo o carinho do mundo, mesmo com pesadas palmadas na bunda - registros do bem e do mal – a escolha era sempre minha. Se as mereciam? Aí já é outra questão. Não vou dá, agora, a minha mão a palmatória.
Olhei para o meu casaco pendurado no cabide e fui até ele sorrindo, tirei de dentro de seu bolso, o meu segredo: a maçã que tinha guardado escondido da menininha. Mordi-a e a saboreei com muito gosto todas as minhas lembranças. A menininha devolveu ao bolso de meu casaco o meu segredo: Lembranças embrulhadas em papel de seda.
Paulo Francisco
Paulo Francisco
Misteriosas
Corri à sacada para observar as maritacas em algazarras no meu telhado. Adoro vê-las em voos rápidos e escandalosos. Saíram do telhado e foram para a copa da árvore do outro lado da rua. Abri um sorriso. As aves me fazem sorrir. Fico fascinado com o voo das aves de rapina que enfeitam o meu céu. Aqui de minha rede vejo-as em voos lentos, tranquilos – são donas, certamente do pedaço.
Uns tempos atrás, quando minhas noites eram regradas de cervejas e papos fiados, subia, ao voltar para casa, uma ladeira íngreme que encurtava o caminho até o meu doce lar. Na metade do percurso, já totalmente sem ar, parava. Numa dessas paradas encontrei uma coruja, no muro de uma casa, me olhando.
Fiquei ali observando a olhuda. Sempre que subia a ladeira, quase todos os dias, lá estava ela a me encarar. Batizei-a de Professora. Nunca entendi e nunca procurei saber, porque o símbolo do magistério é uma coruja. Será que é porque a ave tem olhos grandes e enxerga no escuro? Ou será por que assusta? (brincadeira!)
Fiquei ali observando a olhuda. Sempre que subia a ladeira, quase todos os dias, lá estava ela a me encarar. Batizei-a de Professora. Nunca entendi e nunca procurei saber, porque o símbolo do magistério é uma coruja. Será que é porque a ave tem olhos grandes e enxerga no escuro? Ou será por que assusta? (brincadeira!)
Gostava de vê-la pulando pelo muro, como se quisesse me acompanhar. Certa noite ela não estava mais lá – fiquei triste, já tinha me acostumado com a olhuda sem pescoço.
É sempre assim, quando vou me acostumando com elas, elas se afastam, às vezes em silêncio como a Professora, outras vezes em algazarra como as minhas visitantes.
Tudo bem... continuo aqui na minha rede, olhando pro céu, vendo as aves de rapina de um lado pro outro à procura de uma vitima; continuo aqui neste vai e vem provocado, só esperando, só esperando...
Paulo Francisco
Vento-ventania
O vento sofre. Esta é a sensação que tenho quando escuto, de meu quarto, os uivos do vento. São contínuos e intensos. Fico um tempo enorme decifrando seu lamento.
Talvez seja somente este vento que ouço daqui de minha cama um sofredor. Os outros não. O vento das manhãs solares, por exemplo, sacramenta meu viver. Traz luz e cor no verão. Gosto de sentir em minha cara o vento frio na minha pele quente – refresca como bala de menta.
As ventanias – as meninas ventanias - estas me fazem sorrir, gostam tanto de brincar que saem esbarrando em tudo, são afoitas. Não deixam nada no lugar quando entram em minha casa pelas janelas. Elas não têm, ainda, o controle total da sedução. E que assim seja. Todas elas seguindo seus cursos em movimentos de dançarinas. São aprendizes na arte da vida. Precisarão entrar em muitas janelas para obterem o título de brisa.
Brisa, ah! Ser que seduz; Ser que sabe dar na medida certa o carinho desejado. Sopra lentamente as velas dos barcos e levam mar adentro seus namorados.
A brisa canta as mais belas canções em nossa alma. Permite-nos sonhar. É senhora de nossa existência. Consegue com seus sopros contínuos e aveludados nos transportar para os sonhos mais distantes. Ela ressuscita a esperança. Traça em dedos de luva o caminho a ser percorrido. Engolimo-las como flocos de algodão-doce.
São tantos os ventos.
Os Cecilianos que carregam as palavras doces de suas poesias até nossos corações; os assustadores de Heloisa que nos esperam do outro lado da rua, e os que navegam espalhando os mais variados dos sentimentos nos versos de Claudia Lemos, num controvento-deseventora.
Aqui de meu quarto escuto o vento que sofre. Tenho a sensação que ele procura algo para aliviar sua dor. Bate em todas as portas e janelas à procura de algo que se perdeu. Será que procura por um amor que o abandonou?.
Na dúvida, pego carona em sua cauda e viajo por este mundo em dueto com seu canto, quem sabe não encontro o meu...quem sabe...
Paulo Francisco
Assinar:
Comentários (Atom)