O vento bate insistentemente em sua janela. Aquele tremor, cadenciado, não a deixa dormir. Corpo cansado, pálpebras pesadas, calcanhares doloridos, não quer levantar para fechar a estúpida e irritante janela. Tateia sua mão no escuro até o criado-mudo à procura de seu remédio. ¨Maldita cabeça! Esqueci de ligar para a farmácia!¨ - Exclama a cansada mulher.
Travesseiro cobrindo a cabeça, travesseiro separando os joelhos. Tira lençol, coloca lençol – não consegue relaxar. O som ecoa por todo o cômodo. Vencida pelo barulho insistente, levanta, acende o abajur, vai até a teimosa e a cala por completo.
Abre a gaveta do criado-mudo, vasculha a bolsa, vai até o armário de seu banheiro e nada. Não encontra o remédio que a faria apagar por longas horas.
Caminha até a cozinha, faz um chá. Volta para seu quarto e em sua confortável cama, delicia-se com o sabor e a temperatura daquele liquido. Olha para a janela – agora silenciosa – sorrir o sorriso do vingador.
Ajeita-se, vira-se para um lado, pernas dobradas, pernas esticadas, braços juntos ao corpo, braços na cabeça, travesseiro cobrindo-lhe a cabeça, vira para o outro lado, travesseiro entre os joelhos... e nada - ainda acordada.
O silêncio absoluto do quarto a obriga escutar os seus próprios pensamentos. Não era mais um barulhinho cadenciado do vento batendo na janela. Cada vez mais inquieta, percebe que não vai conseguir dormir com o silêncio total daquele quarto. Então, levanta e vai em direção da janela, deixando-a como antes, entreaberta. O barulhinho besta que antes era angustiante aos poucos, transforma-se num acalanto para os seus ouvidos, para a sua alma, fazendo-a dormir como um anjo.
Paulo Francisco