Homens maus não sabem voar. Era um deus nos acuda na hora de escolher a personagem. Todos queriam ser o herói que voava com a sua capa mágica. A brincadeira demorava pra começar - ninguém queria ser o vilão. Mas, numa brincadeira de bandidos e mocinhos, um grupo terá que usar a máscara preta do bandido.
Ela
não voava. Não conseguia pegar carona nas asas dos meus delírios. Ria muito quando
eu era forçado a aterrissar em solo firme. Não deveria ter sido nada fácil
aturar-me naquelas viagens insólitas e solitárias. Ela era a minha heroína de
máscara preta que tentava, a todo custo, puxar-me pra realidade. Demorei pra
guardar a capa do sonhador; demorei pra descobrir que homens bons também sabem
caminhar em solos pedregosos.
Às
vezes eu ficava imaginando como seria a vida, a minha vida, sem a fantasia da
incerteza. Não me ensinaram que a realidade é sólida como uma rocha, e que os
sonhos são nuvens em construção. E como não tinha aprendido, no tempo certo,
discernir um do outro, desenvolvi a síndrome do sonhador. Eu era, e não me
envergonhava de ser, um sonhador nato. Usava as rochas duras da realidade para me
puncionar em voos solitários e coloridos.
Certamente
não me enquadrava em seu mundo perfeito e concreto. Enquanto ainda pensava que
podia voar, ela já estava com os dois pés fincados em seus objetivos práticos e
certeiros. Eu não estava nem de longe próximo ao seu alvo. Ela me enxergava, eu
a sonhava.
Ainda
continuo sonhando. Ainda continuo evitando as rochas pesadas e sombrias. Talvez
eu nunca consiga caminhar por muito tempo em solo firme. Talvez nunca deixe de
pensar que ainda posso voar. Pois mesmo
com os dois pés atolados ao chão a minha cabeça continua no mundo da lua.
Dizem
por aí que homens maus não conseguem voar. Não sei se eles voam, se eles ao
menos flutuam; só sei que viajar em brancas nuvens me faz muito bem.
Sentado
no banco de trás do carro da Malu, depois de um happy hour com vinhos e risos,
viajei com a canção que estava tocando – Billy Paul é tudo de bom.
De
repente o celular toca acordando-me de um sonho não tão impossível. Ao desligar
o aparelho, penso: Homens maus não devem voar.
Paulo Francisco