Eu não me apego a detalhes. Sandra Dias, num dia desses, no trabalho, afirmou numa conversa nossa ¨- Paulo, mulheres se apegam a detalhes, o homem passa batido, ele é mais direto.¨ Fiquei pensando na afirmativa de minha amiga. Realmente, eu não sou detalhista. Às vezes me perco neste aspecto. Quando estou distraído, não percebo nada. Não sei se o que ela está vestindo está ou não na moda. Que aquela pintura de cabelo é um tom mais escuro ou claro que o do mês passado. Sou distraído demais.
Sou mais genérico com relação ao que me detém. Não consigo perceber um quilinho a mais ou a menos. Sou mais afetivo que visual. Sou mais detalhista num beijo; num afago. Minhas mãos enxergam melhores que os meus olhos e, os meus olhos falam mais que minha boca. Vejo por um todo, vejo mais inteiro. E é aí que eu danço.
Mas não conheço um amigo que perceba detalhes. Tudo bem, eu elogio, mas quando eu elogio é pelo conjunto da obra. Não por um pequeno detalhe. Como vou saber que a cor da unha mudou para uma cor mais quente. Quando olho, olho pra mão e não somente para os anéis; quando olho para os seus cílios, esqueço a cor das meninas de seus olhos e, quando olho os seus olhos, vejo o por inteiro. Acho que tenho que parar de olhar em raio X. Vejo o seu interior – gosto de alma. Deixo a aparência para o segundo plano.
Sabe esta coisa de não esmagar nas entrelinhas que a Clarice disse. Acho que lá, nas entrelinhas, estão o que elas querem ler ou ouvir. Então não adianta falar somente sobre um vaso com um cacto, porque acaba, ela achando que é o cacto e não a flor existente. A pipa é ela, mesmo que eu tenha achado que o céu fosse dela. As gaivotas são dela e não as brumas. O mar pertence a ela e não o barco.
Gosto de falar coisas de amor. De todo o tipo de amor. Gosto de amores calmos, pacíficos, mas não dispenso um momento tempestuoso de quando em quando. Calmaria demais enjoa. Tempestade demais sufoca.
Como escrever e deixar nas entrelinhas somente o vazio entre elas. Talvez eu faça isso, mas tenho certeza que ela vai achar que tudo está ali, no invisível, no viés; que tudo é pra ela. E às vezes é, confesso.
Não me detenho a detalhes e aí eu danço. Danço miudinho, no sapatinho.
Será que a distração é uma peculiaridade minha? Não, não mesmo. Sou distraído, mas não sou bobo.
Até porque a alma feminina pertence a elas. Deixa-me com a minha masculina e distraída.
As estrias são delas.
As celulites são delas.
As gordurinhas são delas.
O que eu quero mesmo é a alma.
Paulo Francisco