Ela o amou
tanto que se perdeu entre nuvens e transformou-se em chuva.
Durmo contemplando o céu marinho, acordo com ele azulzinho. Não gosto de discursos, gosto mesmo é de poesia. Odeio conversas fiadas, mas adoro uma boa história contada.
Enredada
Achava-se
esperta, conhecedora dos sentimentos alheios; tão implacável na arte de enganar
que acabara esquecendo-se da própria identidade.
Ficou presa
na teia construída.
Perdão
Na ponta do cílio, a última gota de um sentimento guardado.
O sorriso veio leve, os olhos desembaçaram-se com um esfregar de mãos, e a vida
seguiu o seu fluxo margeado por flores, bichos alados e poucas intempéries. No
chão, pés descalços. Na cabeça, nuvens.
Voltou a sonhar.
Ela
Para o meu bem querer
Estava tão distraído que não
percebi sua chegada. Quando dei por mim, seus braços e pernas estavam
enroscados no meu corpo. Tarde morna de pouca luz e pensamentos cinzas. Chegou
na hora certa. Salvou-me da tristeza que estava por vir. Esqueci tudo e recebi
seu carinho como um menino acalentado por quem o ama. Não disse nada,
simplesmente aqueceu meu corpo com o seu. Sabia que naquele instante o silêncio
pertencia-me e era necessário como o vento ao mundo. Deixou-me quieto na
particularidade da minha mansidão. Éramos poesia em construção. Paisagem a ser
colorida.
Os meus olhos sorriram
quando perceberam sua presença num sono tranquilo. A noite estampada de
estrelas, decorava a janela. A penumbra guiou-me para fora do quarto. Não
queria acordá-la. Torcia para que estivesse sonhando comigo - Exagero de quem
estava com fome de amor.
Estava tão bonita que não
parei de olhá-la. Fiquei de longe, de soslaio, sem dar bandeira. De quando em
vez, encarava-a por alguns segundos. Éramos dois estranhos naquele ambiente de
gente conhecida. Na claridade, éramos invisíveis. Revelávamo-nos somente com o
aparecimento da lua – nosso instante era crepuscular. Ficamos nessa condição
por muito tempo. Hoje, tudo mudou, somos dia, somos noite, somos todos os dias
se quisermos. Mas ainda assim, preferimos a lua e a invisibilidade. Liberdade
pra poucos. Concessão amorosa de quem sabe o que quer.
Furtou-me o ciúme e doou-me
a crença. Fico mais tranquilo assim. Na terça-feira passada (13 de novembro), o
celular vibra – era ela:
- Paulo, tudo bem?
- Tudo...
- Vi você, hoje à tarde,
entrando na loja O Boticário.
- Fui comprar uns mimos para
as moças do consultório do Marcos...
- E a moça que estava com
você?
- É uma colega do trabalho.
Foi comigo, me fez companhia...
- A gente se vê hoje?
- Você sabe que não...
- Ok, hoje é um dia
especial... dia de solidão...
- Verdade!
- A gente se vê amanhã
então.
- Beijo...
Na distração, prefiro o meu
silêncio, a minha capacidade de viajar entre nuvens e tingir-me de cores
guardadas no peito. Acho que ela tenta entender esse comportamento clandestino,
essa ausência de corpo presente, essa limpeza de feridas antigas. Mas não sei
até quando... Nesse feriado grande, desci para molhar os pés no mar. Ela
preferiu seguir outros caminhos.
Estava tão distraído que não
percebi sua despedida.
Retratos
Estava pensando em escrever um texto para o blog quando
toca no rádio Selah Sue cantando Alone. Caí na gargalhada e pensei: só falta
tocar agora a música Sempre será do Araketu. Não tocou. Mas como gosto da
completude no sentir, fui na pasta de músicas e busquei a canção que conheci há
pouco tempo – foi um presente. E como o texto que estava pensando era para quem
me presenteou com a mesma (por isso as gargalhadas), pensei baixinho enquanto
ouvia Tatau: Sintonia noturna? Conexão
afetiva? Um sorriso abriu em meu peito e o meu coração seguiu o balanço da
música e as palavras surgiram na tela do computador.
Todos sabem que gosto de escrever as minhas complexidades
amorosas, extravasar em palavras as paixões retidas, metaforizar os desejos
ocultos, emergir algumas vontades e exorcizar os meus fantasmas. Mas quando
escrevo sobre ela ou para ela, há carinho, respeito, bem querer e muito tesão à
flor da pele.
Sorria para disfarçar as mãos frias e suadas. Tentava ser
o mais natural possível. Mas os olhos cheios d’água traíam o inútil disfarce de
um macho que sofria por dentro com a triste e a inevitável despedida. A certeza
do nunca mais era flecha no coração – apache abatido como presa no seu próprio
habitat. Morte lenta e sofrida até a próxima paixão.
A razão pedia para parar. Sabia que se teimássemos em
continuar com aquela loucura algo de ruim poderia acontecer. Às vezes, o
sacrifício é necessário para continuarmos vivos. Água desviada de seu percurso
pode salvar, mas também pode alagar e afogar. O coração dizia sim, mas a razão
gritava não.
Desembarquei no primeiro cais sem molhar os pés. Já estava
acostumado a ficar às margens na metade do percurso. Coisa de quem viaja na
maioria das vezes na clandestinidade.
Nada além de noites furtivas banhadas por vinhos e
salpicadas por beijinhos. Tem relação que só funciona no silêncio da noite. Não
tínhamos interesse em mudar nada na gente e na relação construída. Em noites
carentes salvávamos com um chamado. O trato era sair como entramos, sem
cobranças e sem perguntas. Numa noite de lua azul, o silêncio cobriu-nos como
manto e os nossos rostos desapareceram como mágica na escuridão.
Com o pé quebrado e sendo paparicado por quem me guardou
no ventre e sentiu a dor de me parir numa tarde de domingo, fico aqui no
computador escrevendo meus delírios e descrevendo fragmentos de amores antigos,
opacos e ruídos pelo tempo.
Fui, certamente, culpado na maioria das vezes que me
encontrei naufragando nas minhas próprias lágrimas. Já solucei, chorei rios,
escrevi poemas como forma de testemunho e vingança. Catarse necessária para
poder continuar essa jornada que para muitos é leve e natural. Sempre fica
pedaço de mim pelo caminho – dificilmente saio inteiro numa despedida. Mas nem
por isso deixo de tentar encontrar o que me fará inteiro outra vez. Agarro-me
nas asas da esperança e sigo sem destino à procura de um colo que me abrigue
sem nenhuma cobrança e apelos.
Hoje encontro-me só, mas ainda continuo ouvindo canções
de amor.
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