Durmo contemplando o céu marinho, acordo com ele azulzinho. Não gosto de discursos, gosto mesmo é de poesia. Odeio conversas fiadas, mas adoro uma boa história contada.
Riscos
Escreve a palavra saudade e, aos poucos, cobre o nome com riscos fortes e paralelos. Em seguida surge um outro nome e, no mesmo ritual, riscos fortes os transformam num grande borrão azul.
Mas o que adianta? A certeza de sua existência do outro lado da escuridão é inevitável. Então, volta escrever o nome de quem quer esquecer e numa linha ininterrupta, o contorna e, ao chegar no final do tracejar, descobre que o inevitável não é a certeza de sua existência e sim do amor que ainda sente.
Paulo Francisco
Bobagem
Ele estava tranquilo em casa, ouvindo suas músicas antigas, tomando uma taça de vinho, quando o telefone toca e, preguiçosamente, sai do macio tapete, para atendê-lo. Do outro lado, escuta uma voz que tempos atrás o deixaria excitado, somente com aquele alô. Mas hoje, era para ele, uma voz comum, entre várias outras que escutara todos os dias.
Ao término da conversa, quase formal, ele volta para seu confortável tapete branco. Uma voz macia e doce, quase angelical, pergunta: ¨Quem era? O que queria?¨ Ele responde baixinho: ¨ Ninguém.... bobagem.¨
Paulo Francisco
Ao término da conversa, quase formal, ele volta para seu confortável tapete branco. Uma voz macia e doce, quase angelical, pergunta: ¨Quem era? O que queria?¨ Ele responde baixinho: ¨ Ninguém.... bobagem.¨
Paulo Francisco
Pra sempre
Aquele amor que um dia fora prometido
pra toda vida, durou o tempo de amar. Foi intensamente belo, imensamente
eterno.
O amor jurado cumpriu com o seu
destino. Carlos e Maria se foram, partiram felizes com seus corpos curvados,
com suas mãos manchadas e com suas faces vincadas.
Aquele amor que um dia foi pra toda vida, durou o tempo de amar. Foi
belamente intenso, eternamente imenso. Carlos foi primeiro, Maria, logo em
seguida. Aquele amor,prometido pra toda vida, durou até a eternidade.
Paulo Francisco
Paulo Francisco
Um dia de Índio
Resolvi ir ao parque antes do entardecer. Era
necessário. Estava agitado. Precisava ficar olhando o nada; descarregar meu
corpo, jogar pra fora o que estava preso em meu peito; preencher os espaços
vazios em minha cabeça, com imagens fora do meu cotidiano. Era importante
que eu fizesse tal passeio pra ter certeza de que ainda fazia parte dela.
Tem dia que a gente acorda e não se encontra. É
como se acordássemos com ressaca do mundo. Acordei assim: tonto de mim mesmo.
Quando estou desalinhado, um tanto quanto
perdido, procuro o equilíbrio em lugares naturalmente harmoniosos. E aqui, em
minha Cidade, o Parque Nacional é um desses lugares, onde a gente se encontra e
afasta de dentro do peito os fantasmas interrogativos.
Eu não tenho a areia da
praia pra andar. Caminho sujando os meus pés em gramas verdes e alheias.
Disputo, sem pudor, as gramíneas com seus donos naturais: as aranhas, os grilos, as formigas e outros seres estranhos.
Permaneci ali, olhando a cachoeira, pássaros
despreocupados, insetos diversos e algumas pessoas incrivelmente tranquilas
conversando baixinho pra não assustar a mata.
Depois de algum tempo, deitado naquele tapete
verde, sentei-me numa pedra e ali fiquei por algum tempo - quase em transe,
olhando pra Cidade lá embaixo, lá longe, muito longe do alcance de minhas mãos,
mas muito perto de meu coração angustiado e acelerado, que aos poucos, foi
voltando ao seu batimento normal. Diástole e sístole em busca do compasso
perfeito.
Deixei na cachoeira toda aquela sensação de
negatividade existente. Lavei os meus pés em água corrente. Molhei minha cabeça
na água que escorria por uma fenda rochosa. Sequei-me ao vento. Tornei-me parte
integrante daquela floresta.
De quando em quando, é importante repetir o
que nos faz bem. Ir ao Parque Nacional é sempre revitalizante pra mim. Hematopoieticamente falando.
Foi bom o tempo que durou. Sai de meu habitat
emprestado, quando a tarde recebia a noite. Voltei com as asas emprestadas dos
pássaros, voei e flutuei até ao meu nicho – minha casa.
Ainda com a natureza impregnada nos poros, andei nu
pela casa, sem me importar com portas e janelas abertas. Dei boa noite ao tempo
e vigiei a lua da varanda da minha casa. Gosto desta sensação de liberdade.
O telefone toca e me desperta para a realidade nua
e crua. Era ela querendo discutir sobre problemas pequenos. Pequenos para
mim. Talvez, pra ela, não fossem tão pequenos assim.
Enquanto falava, lembrava-me do Parque e como foi
boa a minha tarde verde, numa viagem de cumplicidade entre mim e a mata.
Sabia que algo de estranho estava pra acontecer.
Sorte ter voltado de bem com a vida. Já não estava mais tonto de mim mesmo.
Estava era embriagado de clorofila; estava leve como as cortinas da janela de
meu quarto, que, com o vento, bailavam como bailarinas clássicas.
Enquanto ela gritava, eu contava estrelas; enquanto
ela esperava uma resposta questionadora, eu simplesmente, concordava com as
suas teorias e seus protestos. A noite estava bela. Discutir pra quê? A noite
só estava começando. Ainda tinha que namorar a lua.
Não conseguindo me irritar, bateu o telefone na
minha cara. É quase certo que ela venha aqui pra casa discutir comigo
¨face to face¨ , é típico de sua personalidade.
Amanhã, eu faço um novo percurso. O Parque é logo
ali. Quem sabe não sobe a serra e mais calma, rola comigo na relva. Seria bom.
Minha natureza agradeceria.
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