Resolvi ir ao parque antes do entardecer. Era
necessário. Estava agitado. Precisava ficar olhando o nada; descarregar meu
corpo, jogar pra fora o que estava preso em meu peito; preencher os espaços
vazios em minha cabeça, com imagens fora do meu cotidiano. Era importante
que eu fizesse tal passeio pra ter certeza de que ainda fazia parte dela.
Tem dia que a gente acorda e não se encontra. É
como se acordássemos com ressaca do mundo. Acordei assim: tonto de mim mesmo.
Quando estou desalinhado, um tanto quanto
perdido, procuro o equilíbrio em lugares naturalmente harmoniosos. E aqui, em
minha Cidade, o Parque Nacional é um desses lugares, onde a gente se encontra e
afasta de dentro do peito os fantasmas interrogativos.
Eu não tenho a areia da
praia pra andar. Caminho sujando os meus pés em gramas verdes e alheias.
Disputo, sem pudor, as gramíneas com seus donos naturais: as aranhas, os grilos, as formigas e outros seres estranhos.
Permaneci ali, olhando a cachoeira, pássaros
despreocupados, insetos diversos e algumas pessoas incrivelmente tranquilas
conversando baixinho pra não assustar a mata.
Depois de algum tempo, deitado naquele tapete
verde, sentei-me numa pedra e ali fiquei por algum tempo - quase em transe,
olhando pra Cidade lá embaixo, lá longe, muito longe do alcance de minhas mãos,
mas muito perto de meu coração angustiado e acelerado, que aos poucos, foi
voltando ao seu batimento normal. Diástole e sístole em busca do compasso
perfeito.
Deixei na cachoeira toda aquela sensação de
negatividade existente. Lavei os meus pés em água corrente. Molhei minha cabeça
na água que escorria por uma fenda rochosa. Sequei-me ao vento. Tornei-me parte
integrante daquela floresta.
De quando em quando, é importante repetir o
que nos faz bem. Ir ao Parque Nacional é sempre revitalizante pra mim. Hematopoieticamente falando.
Foi bom o tempo que durou. Sai de meu habitat
emprestado, quando a tarde recebia a noite. Voltei com as asas emprestadas dos
pássaros, voei e flutuei até ao meu nicho – minha casa.
Ainda com a natureza impregnada nos poros, andei nu
pela casa, sem me importar com portas e janelas abertas. Dei boa noite ao tempo
e vigiei a lua da varanda da minha casa. Gosto desta sensação de liberdade.
O telefone toca e me desperta para a realidade nua
e crua. Era ela querendo discutir sobre problemas pequenos. Pequenos para
mim. Talvez, pra ela, não fossem tão pequenos assim.
Enquanto falava, lembrava-me do Parque e como foi
boa a minha tarde verde, numa viagem de cumplicidade entre mim e a mata.
Sabia que algo de estranho estava pra acontecer.
Sorte ter voltado de bem com a vida. Já não estava mais tonto de mim mesmo.
Estava era embriagado de clorofila; estava leve como as cortinas da janela de
meu quarto, que, com o vento, bailavam como bailarinas clássicas.
Enquanto ela gritava, eu contava estrelas; enquanto
ela esperava uma resposta questionadora, eu simplesmente, concordava com as
suas teorias e seus protestos. A noite estava bela. Discutir pra quê? A noite
só estava começando. Ainda tinha que namorar a lua.
Não conseguindo me irritar, bateu o telefone na
minha cara. É quase certo que ela venha aqui pra casa discutir comigo
¨face to face¨ , é típico de sua personalidade.
Amanhã, eu faço um novo percurso. O Parque é logo
ali. Quem sabe não sobe a serra e mais calma, rola comigo na relva. Seria bom.
Minha natureza agradeceria.
Lindo texto, bem construido, nada enfadonho, gostosíssimo de se ler.
ResponderExcluirTambém adoro vigiar a lua.
Meu abraço
Paulo,um belo texto e a natureza renova mesmo nosso astral!Todos deveriam fazer um passeio assim todos os dias!bjs,
ResponderExcluir... e um índio poeta a gente não encontra todo dia ,
ResponderExcluiramei esse lirismo com quase um pedido de reconciliação...
saudade Paulo
abraços