Não me cubro em noites de estrelas. A tarde terminou tarde. Vinte horas e ainda era de dia. O céu teima na transparência nessa época do ano. Verão é a estação em que os vampiros dormem mais. Não gosto de acordar cedo, e muito menos uma hora antes do combinado – isso acaba comigo.
Raramente chego atrasado, exceto no trabalho –
principalmente no horário de verão.
Combinei às oito. Um bom horário para começarmos a noite. Mas a distração é o meu pecado maior. Esperei
o azul marinho chegar, como a Ave-Maria chegava do rádio as nossas casas no
final da tarde. Era o aviso, junto às
badaladas do sino, que a noite chegara. Coisa que não aconteceu. Quando percebi
não era mais de dia - já era tarde, tarde
demais para o encontro. Restou-me ligar para me explicar. Fui perdoado pelo que
não tenho: Não tenho celular e não uso relógio.
Fui perdoado pelo que sou e pela a minha maneira de ser. Restou-me uma
nova chance com um novo horário para o nosso encontro esperado.
Nos dias de verão tudo era maior. As brincadeiras varavam as
tardes e terminavam em noites de estrelas.
Éramos andorinhas voando em bando.
Moleques esquecidos pelos ponteiros do relógio. Pai e mãe têm medo do
escuro. Depois das seis, brincadeiras só em frente ao portão. Mas no verão os portões ficavam longe de
nossos olhos e pernas. Hoje, as crianças têm portarias e porteiros. São os
acordos de um tempo indefinido.
No dia seguinte da minha distração, tornei-me guardião provisório
do tempo, para não repetir a gafe do dia anterior. A reincidência faz parte do meu histórico. Era
só um encontro. Um primeiro encontro de reconhecimento. Somos batedores à procura de rastros que nos
levem ao que desejamos. Mas nada
aconteceu. Só ficamos naquele encontro. Em noites sem estrelas eu me cubro por
inteiro. Delibero rapidamente. Não tenho muito que pensar. E nesse encontro,
deliberamos juntos. Não foi o encontro esperado, mas foi divertido.
Quando a incompatibilidade é maior que tudo, o melhor é não
insistir.
Lá estávamos, no verão passado, de mãos dadas curtindo uma
semana de férias longe da nossa zona de conforto. Praias, ilhas, cachoeiras,
exposições, artesanatos, livros e muito mais. Estava tudo indo bem quando de
repente uma frase mal colocada jogou tudo por água abaixo. Éramos compatíveis em quase tudo. A única
diferença estava no que achávamos do casamento. Enquanto ela vestia a sua causa
de véu e grinalda, eu me despia em abandono. Tirava de mim a possibilidade do
terno e abria a braguilha da bermuda. Pulei
ao mar. Eu não me cubro em noites de estrelas.
Paulo Francisco
Oi Paulo,
ResponderExcluirSou mais pelo casamento de ideias, sem véu, na verdade absoluta. Bjs. Marli
Olá Paulo,conheci o seu blog e gostei de sua escrita.Palavras bem colocadas, as quais criaram um texto falando das diferenças, que mesmo minúsculas podem acabar com os mais belos sonhos. Para mim o que importa não é ter razão,mas ser feliz. Então seja! Sigo-te.
ResponderExcluirGrande abraço!