Para o meu bem querer
Às vezes me sinto numa calmaria budista tibetana. Nada de
afobação – na precipitação, deixamos de lamber os dedos, e o que deveria ser
saboreado é tragado pela impaciência. Sejamos mais tácteis, mais olfativos e
menos urgentes. Correr na chuva não quer dizer que nos molharemos menos. Então,
andemos de mãos dadas na certeza de que chegaremos juntos, não importa quando.
Em sua presença, fico mais leve e menos aflito. Perto de você,
navego em ventos termais e deixo o pensamento fluir, perco-me em desejos
secretos e você sabe disso.
Querer navegar contra a maré é, pelo menos, gasto desnecessário
de energia. Amar é ondear entre as margens do rio, desviando de obstáculos que
porventura venham aparecer. Deixa o barco ir; deixa o sentimento seguir seu
rumo; deixa acontecer. Amar é resguardar e não desnudar. Desejo-te inteira. Inteiro,
habito em ti.
O coração bateu forte quando a vi depois de tanto tempo. Por
um instante ficamos silenciosos como se estivéssemos num templo orando a Deus. Depois
da levitação, ela rasga a minha timidez perguntando-me, com voz suave, como
estava. Sorri, e sem dizer uma única palavra, inclinei-me para beijá-la na
face.
Tudo voltou: a emoção, o desejo, a leveza e a certeza da
nossa existência. As nossas urgências não nos definiam; os nossos olhos, denunciavam-nos
e as nossas mãos nos comprometiam. Mas naquele momento éramos água seguindo,
cada qual, o seu curso. Quem sabe num outro dia. O mar estava logo ali,
acariciando a montanha e cobrindo os meus pés de areia.
De repente tudo mudou quando, sem querer, encontramo-nos no
meio da multidão. Um sorriso, um abraço apertado não querendo soltar. Estávamos
visivelmente felizes com a surpresa do encontro. Um carinho no rosto, uma
mexida no cabelo, um segurar de mãos e seguimos para fora daquela aglomeração.
De repente a tristeza que alagava meu corpo evaporou
transformando-se mais tarde em chuva. Guardamos os nossos compromissos e
urgências nas mochilas e esquecemo-nos em conversas e sorrisos numa confeitaria.
Conversas doces regadas com café e creme. Amizade com cobertura colorida e
florida de amor. Despedimo-nos à sombra da lua.
Depois de alguns encontros e desencontros sempre volto para
casa querendo ouvir, ao som do violão, canções de amor. Da minha varanda,
espero-te na esperança de tê-la. Depois de um dia chuvoso e quente, quero mesmo
que a calmaria do meu quarto seja rasgada pela disritmia provocada por sua
chegada. É assim que tem que ser e é assim que vai acontecer - sem urgência. E depois
de tudo, quando nos desgrudarmos não diremos adeus, pois separados estarão os
nossos corpos, mas o desejo não. Quero-te minha, quero-te colada na minha
retina.
Às vezes me sinto num templo budista tibetano. Por aqui não
há precipitação – há leveza e poesia. A lua sempre toma conta de mim,
espiando-me atrás da montanha e o sol chega manso, acompanhado de brisa. Lembra-se
da canção que você me presenteou? Nesse momento de amor guardado, de bem
querer, eu a escuto todos os dias pensando em nós dois.
Às vezes me sinto assim:
- Apaixonado por você!